Duas Margens

BEM VINDO ÀS DUAS MARGENS

Espero que possamos partilhar a vontade de construir pontes e passagens, certos de que todas a pontes e passagens têm pelo menos 2 entradas e que todas as entradas são também saídas. Às vezes não importa tanto onde entramos e por onde saímos, mas o que no percurso fazemos juntos.

quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

10 ANOS MAIS TARDE...

Hoje é o último dia da primeira década do séc. XXI. Amanhã será o primeiro dia da segunda década.
Há 10 anos era a vertigem, única e irrepetível, de mudar de ano, de mudar de século, de mudar de milénio.
Ia mudar tudo. O século XXI era o grande mito, o grande horizonte, todas as janelas (windows) abertas para um mundo novo.
O 9/11 (Queda do Muro de Berlim) tinha acabado de limpar o cenário e redefinir os horizontes de todas as esperanças, de todas as mudanças, de todos os possíveis. Fomos todos (?) berlinenses.
Cedo nessa vertigem (11/09) caíram-nos em cima os aviões que transformaram as Torres (World Trade Center) no grande espectáculo de uma das marcas do século e fizeram de todos nós (?) americanos.
Falávamos na globalização que estava para vir e nem sabíamos do que falávamos.
Aprendemos a soletrar palavras novas e inglesas para falar de coisas que nem imaginávamos. Outsourcing, insourcing, offshoring, downloading, uploading, e expressões como digitalização e software de sistematização de fluxos de trabalho, supply-chaining, sem as quais hoje não conseguimos sequer falar com sentido do mundo, da vida, da sociedade, da economia das organizações, das empresas, dos indivíduos.
Começámos a falar da Índia e da China como se sempre nos tivessem sido familiares.
Habituámo-nos a falar da Europa como se estivesse feita e a achar natural e um direito adquirido os “dinheiros de Bruxelas”.
Há 10 anos imaginámos que íamos entrar num mundo inteiramente novo.
Hoje estamos num mundo inteiramente novo e não o conseguimos imaginar.
Deixem me voltar a Marx. Não basta interpretar o mundo. É preciso transformá-lo. Certo.
Mas sem o interpretar nunca o transformaremos.
E acho que estamos bem longe.
Jan yang nan mau ping shun tan ming yao, que é como quem em chinês diz (salvo erro) Bom Ano Novo.
BOA PASSAGEM DE ANO E FELICIDADES!

domingo, 27 de dezembro de 2009

ENSINAR A MOSCA A SAÍR DA GARRAFA

Decidi que, em princípio, não falo, escrevo ou comento matéria de política local. Creio ser uma boa decisão, além disso facilmente compreensível.
Mas... há sempre um mas...
Soube, sem surpresa, da decisão do Dr. Amaral, na Assembleia Municipal de 18 de Dezembro. Não compareceu, enviando uma carta em que explicava o seu pedido de renúncia ao mandato de deputado municipal.
No Primeira Linha da semana passada numa entrevista retoma os termos da carta e explica, a todos nós, os motivos da sua decisão.
Não vale a pena retomar aqui os fundamentos da sua decisão, ou os argumentos que, na sua análise, a justificaram e exigiram. Esses pode encontrá-los e conhecê-los directamente, sem intermediário.
Quero apenas salientar que o Dr. Amaral iniciou, em Janeiro de 2009, uma experiência política em que assumiu responsabilidades, se empenhou e se comprometeu, perante a comunidade e cada um dos eleitores.
Passado um ano (mais ou menos) decide-se por uma ruptura. Explica-a publicamente.
O que quero sublinhar, todavia, é o acto em si mesmo, da ruptura. Imagino: deve ter custado muito. Deve ter sido daquelas decisões que doem. Um homem põe o seu nome,a sua assinatura, a sua palavra, a sua cara, a sua credibilidade pessoal, o seu trabalho, o seu prestígio, enfim, investe-se pessoalmente num projecto no início do ano e no fim do ano vem assumir publicamente a demissão, a renúncia, e contar-nos e fazer a avaliação nos termos em que o Dr. Amaral o faz, sem omitir ou escolher as palavras mais suaves. Imagino o que lhe custou. Imagino a dureza do debate interior que terá vivido. Como o posso imaginar, admiro o gesto. Assume, clarifica, não deixa equívocos, traça as lihas de demarcação que, na sua opinião, a situação impunha.
A filosofia, dizia Wittgenstein, é ensinar a mosca a saír da garrafa.
O Dr. Amaral mostrou que se pode saír da garrafa. E porquê. E como.
Tem a minha admiração.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

domingo, 20 de dezembro de 2009

DOUTORES E ENGENHEIROS

Poderemos admitir, sem necessidade de prova, que os advogados e juristas têm hegemonizado a vida política. Bem, Cavaco, Guterres e Sócrates não são advogados nem de formação jurídica, antes economista e engenheiros. Mas não quer dizer que a classe política não seja e tenha sido maioritariamente constituída por advogados, e a nossa sociedade não continue a ser inspirada num paradigma jurídico e não num paradigma técnico e científico.
Veja, por exemplo. Depois do 25 de Abril tivemos de reconstruir o Estado, reconfigurá-lo como Estado de Direito, construir as instituições da democracia, definir o novo edifício constitucional e jurídico da nossa vida democrática. Tivemos Mário Soares, Sá Carneiro, Freitas do Amaral Álvaro Cunhal como grandes figurantes – todos advogados/juristas, e uma plêiade de homens brilhantes como Almeida Santos, Mota Pinto, Vital Moreira e outros, todos advogados/juristas. Precisámos deles, tivemo-los. Fizeram o seu trabalho. No essencial, bem, digo eu.
Passaram mais de três décadas. As tarefas da nossa democracia e da nossa sociedade continuam a exigir, do mesmo modo, com a mesma intensidade e a mesma proporção, o primado da visão jurídica da sociedade, os seus mecanismos e o seu funcionamento? Ou esta hegemonia tradicional é hoje factor de bloqueio, é hoje um obstáculo epistemológico (incapacidade de conhecer o funcionamento da própria sociedade) e um obstáculo político (incapacidade de decidir o que a sociedade exige que se decida)?
Numa sociedade em que as grandes questões não são já as da legitimação e do ordenamento constitucional e jurídico (sendo que a competência jurídica continua como é óbvio, a ser da maior importância), mas o desenvolvimento económico na sociedade da informação e do conhecimento, o desenvolvimento do sistema científico-tecnológico, a inovação tecnológica e empresarial, faz sentido que sejam, grosso modo, os advogados e os juristas a comandar? Faz sentido que se continue a olhar a sociedade e o seu funcionamento a partir do paradigma, do pensamento, da competência jurídica? Não precisamos também aqui de promover uma mudança de paradigma?
Não precisamos, simplesmente, de promover a entrada mais generalizada de cientistas, técnicos e engenheiros na vida política? Não precisamos de conter a influência da visão jurídica na definição das políticas, programas, estratégias que constroem os caminhos que precisamos de seguir e aumentar a influência do paradigma e da visão da engenharia?
A propósito deixe-me citar John Doerr, investidor: “Fala-se com os líderes da China, que são basicamente todos engenheiros, e compreendem imediatamente o que se está a passar. Os norte americanos não, porque são todos advogados”. Ou Bill Gates: “ Quando nos encontramos com políticos chineses, são invariavelmente cientistas e engenheiros. É possível ter uma conversa sobre números com eles – nunca se debatem temas como ”diga-me uma pequena piada com a qual eu possa embaraçar os meus rivais políticos”. Estamos reunidos com uma burocracia inteligente””. É o Bill Gates, o tal.

(Pub in O Ribatejo, 18.12.09)

sábado, 19 de dezembro de 2009

CASAMENTO HOMO. E ADOPÇÃO?

Sou a favor do casamento entre homossexuais.
Em rigor: sou a favor o casamento entre duas pessoas adultas.
É o direito à auto-determinação. Cada um define-se e assume os compromissos que quer assumir. É uma questão de afirmação de maioridade. É uma questão de maioridade pessoal e civilizacional.
Mais: Perguntar a quem quer que seja se seja quem for pode ou não pode casar-se com outro qualquer é já de si uma limitação de direitos. Por isso também me parece claro que fazer depender esse direito dum referendo, da vontade dos outros, mesmo que seja da vontade dos outros todos, é uma violência inaceitável.
Não tem nada que ver com o que cada um acha da homossexualidade ou isso.
Questão a meu ver inteiramente diferente: Deve ou não aceitar-se que casais de duas pessoas do mesmo sexo possam adoptar crianças? Porque é diferente? A meu ver já não se trata aqui do direito à autodeterminação individual. Neste caso há um terceiro: a criança. Sobre a qual se exerce um acto, uma opção, uma escolha. Da qual a criança não é o sujeito autodeterminado, antes o objecto determinado. Isso, a meu ver, muda inteiramente as coisas. Não se pode afirmar que do casamento gay se deduz
a adopção e que um é a consequência natural ou lógica do outro, como se fossem actos ou factos da mesma natureza. Parece me claro que não são.
Vamos, todavia, ter que debater e fazer um esforço de clarificação muito mais exigente.

MOONLIGHT, BEETHOVEN

Um dia destes, cinzento, com chuva e frio, ocorreu-me Moonlight (para mim era Clair de Lune, em francês, do disco em que ouvi pela primeira vez).
Ocorreu-me, acho, pelo dia que me fez lembrar.
Istambul, fim de Novembro de 2008. Hotel Hilton (não lembro de qual, há mais que um em Istamul). Sentado no grande átrio, ao fim da tarde de um dia assim, esperava pelo Fernando Ruas (Presidente da CM Viseu e da ANMP). Partilhava com ele o facto de sermos ambos membros do Conselho Mundial e também do Conselho Executivo da UCLG (United Cities and Local Governemens). Realizavam-se em Istambul, justamente no Hilton, as reuniões daqueles dois órgãos. Sentado no átrio, ao fim da tarde, esperava pelo Fernando Ruas. Sentada ao piano, uma mulher jovem (30 e poucos, alta, magra, cabelo comprido ondulando pelos ombros, tocava para todos, para ninguém. Já tinha tocado no dia anterior, eu tinha reparado e tinha tocado Moonlight e eu ouvira. Imensa gente estava e circulava, mais ou menos indiferente. Senti indiferença a mais. Ela tocava com a alma e com a doçura e a intensidade que um fim de tarde cinzento, frio e chuvoso estava mesmo a pedir. Aquecia a alma em lume brando. Num pequeno intervalo levantei-me e dirigi-me até ao piano e ela olhou e eu disse assim, não sei porquê, em francês, ontem ouvi-te e admirei o modo como tocas, tocaste Clair de Lune e eu gostei. Ia-me embora e ela disse, em inglês, obrigado, gostaste? gostas de Moonlight? e eu disse sim eu gosto e ela disse vou tocar outra vez para ti e eu fui sentar-me e continuar a beber não sei o quê e a ouvir e ela volta e meia olhava para mim e sorria e o cabelo ondulava-lhe suavemente pelos ombros. Quando acabou olhou me e fez um sorriso maior e eu gostei e ela continuou a tocar, era a vida dela. Foi um momento fugaz e efémero e feliz. Daqueles momentos que às vezes, em dia cinzentos de chuva e frio, evocamos sabe deus porquê e nos sabe bem.
Nunca mais me vou esquecer de Moonlight, de Beethoven.
Foi um belo dia de inverno.

NÃO SE PODE DESPERDIÇAR UMA CRISE

1.
A vida de qualquer comunidade humana baseia-se na confiança.
A economia funda-se na confiança.
Às vezes é necessário lembrar banalidades úteis. (Galileu andava sempre acompanhado por uma pedra que, nos debates que travava, deixava cair, esperando que o interlocutor disso o advertisse “a sua pedra caiu no chão”; ele estava a olhar para cima e comentava “ah, pensei que tivesse caído para cima…”; era a pedra do bom senso). Talvez por isso ainda hoje usemos a expressão “chamar à pedra” quando se trata de introduzir racionalidade…
O que gera a confiança? A estabilidade dos nossos comportamentos, acções, reacções, e a previsibilidade associada. Previsibilidade. Imagine que não consegue prever (razoavelmente) os comportamentos dos seus familiares, amigos, colegas de trabalho, ou que, de repente, se tornassem imprevisíveis? Bem, era problemático saber o que fazer. Era uma crise.
2
Hoje, em Portugal, a dúvida, a incerteza, a imprevisibilidade tornam-se a regra.
Hoje, com a maioria relativa no Parlamento, ninguém sabe quem governa.
A oposição experimenta a vertigem da convergência contra, a vertigem da contra-governação a partir do Parlamento. Faz falta aqui a pedra de Galileu. Particularmente ao PSD.
Enfim, esta vertigem amplia, à vida política e à governação, as incertezas e a imprevisibilidade que ainda hoje vivemos na economia. Ou seja, introduz no coração da política o que era da crise económica e financeira: a imprevisibilidade e a erosão generalizada da confiança.
3
Qual é a agenda politica do país? Bem, a do Governo e do PS é conhecida. Houve um compromisso eleitoral, há um programa de governo, aliás legitimado no Parlamento. E a do Parlamento? Depende… E a do País? Vivemos uma deriva perigosa dependendo apenas da oportunidade e do oportunismo de fazer valer a coligação negativa de que a oposição dispõe.
Impõem-se duas coisas, a meu ver:
- Que o Governo e o PS lancem um desafio clarificador ao país, aos partidos, aos sindicatos, às organizações empresariais, às universidades para um novo protocolo de debate político capaz de identificar a grandes questões do Estado e do País, capazes de ser postas acima da luta política quotidiana. Um Novo Contrato Social em que o país se comprometa, independentemente das flutuações conjunturais. Um Contrato para introduzir a previsibilidade mínima que gere a confiança necessária para pôr o país a andar para a frente.
- Que o PSD defina rapidamente a sua liderança. M Ferreira Leite é apenas passado ressentido, pode dedicar-se a incendiar Roma antes de partir. Só uma nova liderança pode querer apontar ao futuro. Ou seja, retomando alguma ambição de futuro, retomar também a posição do PSD no arco da governabilidade, da responsabilidade. Retirar o PSD do niilismo actual, retirá-lo da vertigem irresponsável e da escalada pró PREC e suicidária em que está envolvido (ver F Balsemão).
4
Não se pode desperdiçar uma crise. Sobretudo uma crise como esta.

(Pub A Barca, 17.12.09)

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

PRESIDENCIAIS. E O PS? E NÓS?

Os candidatos a candidatos estão na expectativa. Os partidos também. Todos? Todos menos um, que aquece motores já na estrada: Manuel Alegre. Para gáudio do BE.Também do PC? Sim, acho eu.
E o PS? Espera, demasiado ocupado com a governação? Espera para ver o que dá Alegre? Espera à espera de A Guterres, de J. Gama, de ...? Espera para ver se nessa espera nos conformamos ao sapo e sua inevitabildade? Alegre quer tornar-se a inevitabilidade do PS. Vai conseguir? Ou melhor: o PS vai por aí?
Sou dos que acha que não. Dos que não quer. O PS tem, na sua àrea bons candidatos e bons possíves futuros Presidentes. Os que referi. Outros. Claro: é preciso querer. Mas a vontade também se organiza, se forma, se reforça. A Presidência é muito exigente. Vêmo-lo com Cavaco, que já deu de si, de fraco e de às vezes não se aguentar no balanço. Exige conhecimento. Da sociedade, da complexidade do mundo, de muitos dossiers e de muitas matérias, da Europa, seus problemas e potencialidades. Exige competências técnicas, políticas, pessoais. Exige capacidade de interlocução, equilíbrio, ponderação. Exige qualificação e currículo. Vejo isso em Guterres e Gama, vejo-o também em Vitorino ou Amado... Não o vejo em Alegre.
Alegre tem atrás de si o quê? Para la de Argel, duma bela voz,tonitruante e cheia de ressonâncias dos anos sesssenta (do século passado), de belos livros de belos poemas e versos, Alegre foi, que eu saiba, SE após o 25 de Abril, numa muito curta experiência governativa, e deputado durante muitos anos. Mas se nos perguntarmos qual o contributo legislativo para a República e o País que lhe devemos, qual ou quais as leis de que foi primeiro subscritor, não sei... Mas tem também a recente aventura e deriva esquerdista de contestação ao Governo de Sócrates, bem acompanhado pelo BE e pelo PC... E uma vaidade e um ego imensos.
Alegre diz às vezes coisas giras e populistas. Talvea algumas fiquem no ouvido. Mas Alegre não é capaz de condensar ou projectar simbolicamente qualquer futuro. Alegre é passado puro, envolto numa retórica de frases feitas e generalistas.
Darei o que tiver que dar por Guterres, por Gama. por Vitorino, por Amado. Ou por outro, a ver. Exijo lhe visão, saber, competência, experiência, conhecimento, equilírio, sensatez. Capacidade de contibuir para a governabilidade, para um novo imaginário de que precisamos, para uma sede e vontade de futuro que nos alimente a capacidade criativa. Não é Alegre.
Espero que o PS não nos dê a tristeza de nos servir Alegre.
Não é o que o País precisa.
É isto o que penso.

TER OU NÃO TER

Imagine que um jornal perguntava a quatro pessoas da sua comunidade o que fariam se fosse presidente de câmara. Pergunta importante. É uma pergunta pela ambição que se tem.
Imagine que três delas se lamentavam. Não interessa, disto e daquilo. Também não importa saber se são queixas relevantes. A quarta foi assertiva e positiva: trabalharia para ter mais fábricas, mais empregos. Também podia ser outra coisa. Três lamentos, uma ambição.
Não interessa o concreto do que cada um diz. Interessa o que aí se mostra: Em quatro, um expressa uma ambição. É pouco, é muito pouco. Imagine isto a nível nacional…
Isto vale o que vale: um sintoma. Genericamente falta-nos ambição. Quer dizer: um imaginário qualquer, um programa de trabalho.
Ocorre-me, a propósito, John Kennedy, em 1961. A URSS tinha acabado de lançar para o espaço o Sputnik, em 1957, e culminado com a colocação no espaço de Yuri Gagarin, ultrapassando os EUA no auge de Guerra Fria. Foi um choque. Os americanos lamentavam-se de ter sido ultrapassados. Foi uma autêntica ferida narcísica no orgulho americano.
Kennedy percebeu o que se passava. A questão não era lançar ou não lançar foguetões espaciais. A questão não era ganhar ou perder a corrida espacial. A questão era ganhar ou perder a luta pelo desenvolvimento científico e tecnológico, a luta pela inovação, a luta e a competição económica, o progresso e o futuro, o lugar dos EUA no mundo.
Kennedy compreendeu que havia aqui uma corrida. A corrida pelo desenvolvimento e crescimento económicos, e que esta era uma corrida pela ciência e tecnologia, pela engenharia, pela inovação, uma corrida pela educação.
Kennedy reagiu protagonizado um dos grandes momentos da cultura política americana. Um dos momentos política e culturalmente mais eficazes da política e cultura americana: o famoso discurso ao Congresso de 25 de Maio da 1961. Nele apelou à América para um esforço de concentração e de vontade para “as grandes necessidades nacionais urgentes”.
Deixe-me citar, que vale a pena.
“Acredito que possuímos todos os recursos e talentos necessários”, diz Kennedy “mas a verdade é que nunca tomámos as decisões (…) Nunca especificámos objectivos de longo alcance num prazo urgente”. E acrescenta, curto e grosso: “Que fique claro que estou a pedir ao Congresso e ao país que aceitem um firme compromisso com um novo rumo de acção e que tem implícitos custos (…) Esta decisão exige um grande compromisso nacional (…) Significa um grau de dedicação, organização e disciplina que nem sempre caracterizou os nossos esforços ao nível (…) do desenvolvimento.”
Ninguém hoje diria melhor: “ Assim estou a transmitir ao Congresso um novo Programa de Formação e Desenvolvimento de Potencia Humano, destinado a orientar ou a reorientar várias centenas de milhares de trabalhadores, especialmente nas áreas onde existe um desemprego crónico em resultado de factores tecnológicos, ao nível das novas competências (…) com vista a substituir essas competências, tornadas obsoletas (…) pelas novas competências que os novos processos exigem.”
- Substituir as competências da população activa pelas novas competências exigida pelos novos processos.
- Renovar e relançar o sistema científico americano, da sua engenharia e capacidade de inovação.
- Lançar uma nova corrida pela educação.
- Desafiar o país a tornar-se mais inteligente.
- Palavras-chave: decisão, objectivos de longo prazo, prazo urgente, compromisso, custo, dedicação, organização, disciplina.
- E tudo à volta de uma ambição, um objectivo, um novo imaginário: Chegar à Lua, pôr um homem na Lua rapidamente. Obrigado, JK.
Poderá Portugal passar sem os nossos tradicionais muros da lamentação? Pode, mas como diz o outro, não será a mesma coisa… Óptimo. É isso mesmo que é preciso.
Temos o Plano Tecnológico… Temos o Plano Tecnológico para as escola e o Magalhães… Temos o Programa para a Energias Renováveis...Temos a banda larga… Temos o Simplex… E temos por cá a ESTA e o Tecnopólo, a Cidade Desportiva e o Tejo, a Central do Pego e o novo Complexo da Energia Fotovoltaica, temos o Mocho XI e uma cidade bonita e dinâmica… e tanta coisas de que nos possamos orgulhar…
Orgulho, crença e ambição. É isto que as novas gerações precisam de aprender de nós. É isto que nós, as comunidades locais e o país, precisamos que as novas gerações assumam. Temos que dar o exemplo e mostrar o caminho.

PARA UMA DECISÃO DE DESENVOLVER

A decisão de optar pelo desenvolvimento, enquanto povo e país, passa pela concertação em torno de um novo programa para um novo contrato social. Talvez demasiado original, invulgar e difícil para a nossa tradição e cultura políticas, o governo, os principais partidos, os sindicatos (mesmo que não todos), as associações empresariais, as universidades devem iniciar um debate sério e construtivo em torno das matérias que constituem o essencial desse novo contrato social, defini-lo e mantê-lo fora e acima das campanhas eleitorais e das mudanças de governo, como a espinha dorsal da nossa decisão para nos desenvolvermos.
Há três vertentes essenciais para definir esse novo contrato: as infra-estruturas, a boa governação, a educação.
Nas infra-estruturas, um macro critério: as infra-estruturas que nos ligam ao mundo e às plataformas tecnológicas e colaborativas do mundo actual. Estradas, TGV, aeroportos, portos. Fibra óptica, larguras de banda da Internet, telemóveis, tecnologias associadas mais disseminadas e baratas.
Boa governação orientada para gerir, do modo mais produtivo possível, os fluxos entre as pessoa e as plataformas do nosso mundo. O sistema financeiro e as leis. Estratégias de mercado, orientação para a exportação, investimento estrangeiro, subsídios, leis de trabalho.
Educação: aumentar o número e pessoas capazes de inovar e participar nos processos de inovação que ocorrem nas plataformas colaborativas e comunidades, organizadas ou espontâneas, que se organizam nas universidades, nas empresas, na net.
Acrescento agora uma quarta vertente, essencial para nós. Confrontados com a dureza da competitividade crescente das economias asiáticas, temos que saber exactamente o que queremos no que respeita ao Estado Social, e como o vamos obter. Lá está: em Setembro, na campanha eleitoral, ainda se discutiu esse tópico. A campanha eleitoral passou e a actualidade do tema também. Todavia á agora que é importante colocar este tema no centro da agenda política e que o tema pode ser discutido com a profundidade e o rigor que exige. É trágico que o que comanda a agenda política do país seja “a actualidade”. Não são os partidos, o governo, o parlamento, o PR. São os títulos dos jornais e as primeiras dos telejornais… Os partidos, o governo, o parlamento, o PR correm e esgotam-se todos os dias atrás dos jornais e da televisão. Impõe-se que seja a política a definir e a comandar a agenda política, ao contrário de se subalternizar e esgotar no comentário político…
Nestas matérias tem que haver opções que se assumam como o nosso programa para desenvolvimento, acima das circunstâncias e da conflitualidade política quotidiana. Muitos admiram-se como em Portugal nos esgotamos num debate perpétuo sobre toda as matérias, todos de repente especialistas a debater num debate onde está sempre tudo em aberto e sem nunca chegar a hora das decisões. Há uns meses almocei com o Encarregado de Negócios da Embaixada da Áustria em Portugal. Na altura estávamos todos ocupados, alegremente e a tempo inteiro, a esgadanhar-nos uns aos outros sobre o novo aeroporto… Exprimiu a sua admiração e perplexidade por esta, digo eu, obsessão colectiva – na Áustria, disse, não discutimos assim. Há um outro protocolo de discussão e debate sobre as grandes questões do Estado e do País. Pois. Há quem discuta com a táctica do tudo ao molho e fé em Deus. Há quem assuma a reguilice como método. Há quem ache que está sempre tudo em discussão. Há, sobretudo, quem ache que o debate político tem de ser um jogo de soma nula, um jogo em que se eu ganho tu perdes e jogamos para ganhar e fazer o outro perder. E há quem tenha uma outra cultura do debate, e protocolos inteligentes de debate em vistas às grandes opções do Estado e do País. Há uma outra cultura que vê também no debate político um jogo de soma não nula, em que pode e deve ganhar o país. Para lá das quatro vertentes enunciadas, há também esta quinta, agora de método: a aprendizagem e a prática de um novo protocolo para os debates e decisões das grandes questões e opções de Estado. Aliás, cada vez mais, em vez de se falar em países subdesenvolvidos, desenvolvidos e muito desenvolvidos, começa a falar-se em países não inteligentes, países inteligentes e países muito inteligentes.
Precisamos de decidir, também, que queremos ser um país muito inteligente.
Muitos outros já decidiram e estão a caminho.

UM PAR DE COISAS SOBRE O MUNDO

Acabei de ler um livro. O Mundo é Plano, de Thomas L. Friedman.
Apeteceu me respigar um par de coisas. É só um convite para que o leia, também.
1.
Imaginemos o mundo como uma cidade. Avenidas, ruas, bairros, zonas.
Imaginemos como, nessa cidade, cada região do mundo poderia ser localizada, figurada.
A Europa seria o centro de dia. Pessoas idosas, carecendo de cuidados de saúde e bem estar. Enfermeiras turcas e emigrantes providenciam cuidados.
Os EUA seriam um grande condomínio fechado, com uma porta principal altamente vigiada, detectores de metais, etc. Uma porta nas traseiras por onde mexicanos e outros emigrantes entram para assegurar a manutenção e o funcionamento do condomínio. Os residentes americanos lamentam-se da preguiça e inutilidade dos trabalhadores …
A América Latina é o bairro dos bares, a zona divertida da cidade. Aí ninguém se deita cedo e tudo recomeça, de manhã, bem tarde.
O Mundo Árabe é a zona perigosa. Só se lá vai quando tem que ser e com segurança… Excepto as ruas Dubai, Qatar, Barhein…
África é a zona de cidade onde as lojas já fecharam todas.
A Ásia Oriental, China, Ìndia, os chamados Estados Tigre, são o enorme mercado. Imensas pequenas lojas, fabricas open space, uns centros educativos aqui e ali onde se luta pelo acesso às universidades, umas Faculdades de Engenharia, Informática, Ciência Naturais… Não se dorme. Trabalha-se afincadamente, poupa-se tudo o que é possível, aprende-se tudo o que se pode. Um sonho domina esta energia fervilhante: passar para o lado bom da vida.
2.
Questionado sobre o modo como a China vê os EUA, um alto funcionário de um grande banco chinês condensou assim o seu pensamento:
Antes, tínhamos medo do lobo.
Depois, quisemos dançar com o lobo.
Agora, queremos ser o lobo.

3.
Conta-se em África a seguinte história.
Todas as manhãs uma gazela acorda
Sabe que tem de correr mais depressa do que o leão mais rápido, se não será comida.
Todas as manhãs um leão acorda.
Sabe que tem de correr mais depressa do que a gazela mais lenta, senão morrerá de fome.
Não interessa se é gazela ou leão.
Quando o sol se levanta, sabe que tem que correr.

4. Temos que correr. Temos que decidir correr. Não se corre sem decisão de correr. Não se corre muito sem uma forte decisão de correr.
Dito de outro modo, o desenvolvimento é um processo voluntário.
Como indivíduos, como comunidades, enquanto países, a opção pelo desenvolvimento é uma decisão a tomar. Porque é sempre possível decidir por outras opções.
Uma decisão, uma escolha.
Nesta decisão, nesta escolha, três aspectos essenciais:
4.1 Precisamos de construir as infra-estruturas que nos ligam, a todos, pessoas, organizações, instituições, as plataforma do mundo global.
4.2 Precisamos de conceber e implementar as políticas públicas nas áreas financeira, do sistema jurídico, dos instrumentos para gerir melhor os fluxos que ligam as pessoas, as organizações, as instituições às plataformas do mundo global.
4.3 Precisamos de ter uma educação capaz de aumentar o número de pessoas a inovar e a ser capazes de entrar nas plataformas do mundo global.

5. E precisamos de ter presente, sempre, que por cada um de nós, país, organizações e instituições, pessoas, há dezenas, dezenas de milhar, centenas de milhar de países, organizações, empresas, pessoas, jovens, que dormem pouco, trabalham muito, ensinam e aprendem tudo o que podem, para chegarem ao lado bom da vida.
Eles correm.
Não importa ser gazela ou ser leão. Eles sabem que têm que correr.
E já decidiram pôr o pé na estrada.

(Pub. in O Ribatejo)

CASAMENTO CATÓLICO

Papa alterou as regras para o casamento católico (Jornal i). Restringe a possibilide de casais em que um não é católico casarem pela igreja. É preocupante e um sinal contraditório. Quando, pelo menos no ocidente, lutamos pela natalidade. Quando pregamos a tolerância e a interculturalidade. Quando o ecumenismo e o diálogo interreligioso parece ser um valor a estimular. Quando a integração de povos, culturas, civilizações é um dado do nosso mundo. Quando é cada vez mais necessário manter abertos e abrir mais canais de comunicação e entendimento, que sinal o Papa está a dar ao mundo? A acompanhar, analisar e debater mais em detalhe. Mas, para já um sinal claro de fechamento.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

NOVO CONTRATO SOCIAL

Tenho reflectido sobre a necessidade de o País (Governo, Partidos, Sindicatos, Ass Empresariais, Universadades, todos nós) se empenhar a necessidade de adoptar um novo protocolo de debate político. Discutimos tudo, a todo o tempo, em todo o lado. como se não houvesse o tempo e a necessidade de decisão. Somos todos especialistas de tudo. Não será necessário ter um compromisso relativo ao debate e às decisões sobre asgrandes questões do Estado e do País? Não será necessário avançarmos para um novo Contrato Social que assuma as invariâncias na política do Estado pelo menos no médio prazo independentemente das conjunturas, partilhado , não por todos, mas ao menos pelos que se reconhece no chamado "arco da governabilidade"? Por exemplo, em áreas chave como a das infraestruturas essenciais, das políticas para a competitividade, da educação, da sustentabilidade do Estado Social - vertentes essenciais - não será possível um acordo mínimo que permita políticas persistentes e evite poíticas ziguezagueantes e erráticas que só levam à degradação das condições do nosso desenvovimento e à erosão da confiança? Temos que discutir tudo como se o debate político fosse um jogo de soma zero (eu ganho, tu perdes) e não pudesse ser um jogo de sona não nula (o país ganha gangamos todos)? Acho que é necessário romover uma nova cultura do debate político. Ao que é cada vez mais necessário construírmos um Novo Contrato Social em que o país se reveja. Acho que, no mínimo, este é um debate necessário.