Duas Margens

BEM VINDO ÀS DUAS MARGENS

Espero que possamos partilhar a vontade de construir pontes e passagens, certos de que todas a pontes e passagens têm pelo menos 2 entradas e que todas as entradas são também saídas. Às vezes não importa tanto onde entramos e por onde saímos, mas o que no percurso fazemos juntos.

sábado, 19 de dezembro de 2009

NÃO SE PODE DESPERDIÇAR UMA CRISE

1.
A vida de qualquer comunidade humana baseia-se na confiança.
A economia funda-se na confiança.
Às vezes é necessário lembrar banalidades úteis. (Galileu andava sempre acompanhado por uma pedra que, nos debates que travava, deixava cair, esperando que o interlocutor disso o advertisse “a sua pedra caiu no chão”; ele estava a olhar para cima e comentava “ah, pensei que tivesse caído para cima…”; era a pedra do bom senso). Talvez por isso ainda hoje usemos a expressão “chamar à pedra” quando se trata de introduzir racionalidade…
O que gera a confiança? A estabilidade dos nossos comportamentos, acções, reacções, e a previsibilidade associada. Previsibilidade. Imagine que não consegue prever (razoavelmente) os comportamentos dos seus familiares, amigos, colegas de trabalho, ou que, de repente, se tornassem imprevisíveis? Bem, era problemático saber o que fazer. Era uma crise.
2
Hoje, em Portugal, a dúvida, a incerteza, a imprevisibilidade tornam-se a regra.
Hoje, com a maioria relativa no Parlamento, ninguém sabe quem governa.
A oposição experimenta a vertigem da convergência contra, a vertigem da contra-governação a partir do Parlamento. Faz falta aqui a pedra de Galileu. Particularmente ao PSD.
Enfim, esta vertigem amplia, à vida política e à governação, as incertezas e a imprevisibilidade que ainda hoje vivemos na economia. Ou seja, introduz no coração da política o que era da crise económica e financeira: a imprevisibilidade e a erosão generalizada da confiança.
3
Qual é a agenda politica do país? Bem, a do Governo e do PS é conhecida. Houve um compromisso eleitoral, há um programa de governo, aliás legitimado no Parlamento. E a do Parlamento? Depende… E a do País? Vivemos uma deriva perigosa dependendo apenas da oportunidade e do oportunismo de fazer valer a coligação negativa de que a oposição dispõe.
Impõem-se duas coisas, a meu ver:
- Que o Governo e o PS lancem um desafio clarificador ao país, aos partidos, aos sindicatos, às organizações empresariais, às universidades para um novo protocolo de debate político capaz de identificar a grandes questões do Estado e do País, capazes de ser postas acima da luta política quotidiana. Um Novo Contrato Social em que o país se comprometa, independentemente das flutuações conjunturais. Um Contrato para introduzir a previsibilidade mínima que gere a confiança necessária para pôr o país a andar para a frente.
- Que o PSD defina rapidamente a sua liderança. M Ferreira Leite é apenas passado ressentido, pode dedicar-se a incendiar Roma antes de partir. Só uma nova liderança pode querer apontar ao futuro. Ou seja, retomando alguma ambição de futuro, retomar também a posição do PSD no arco da governabilidade, da responsabilidade. Retirar o PSD do niilismo actual, retirá-lo da vertigem irresponsável e da escalada pró PREC e suicidária em que está envolvido (ver F Balsemão).
4
Não se pode desperdiçar uma crise. Sobretudo uma crise como esta.

(Pub A Barca, 17.12.09)

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